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segunda-feira, 19 de maio de 2014

Ad Astra Per Aspera!

"Não sentimos dor pela partida de quem amamos; sentimos dor pelo período sofrido e deixada ausência." (de uma conversa noturna com Sunshine)

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Sabe, cara, você nos deixou exatamente num domingo como esse. O sol estava claro como se queimasse mais que os outros dias da semana; no relógio faziam-se onze horas de uma manhã que teimava em não terminar; e esperar saudações suas nunca foi tão difícil como naquele momento. Mas sabe o mais foda? É aquela sensação de incapacidade - de não ter conseguido fazer nada, além de ouvir o telefone tocar, com os maldizeres de um esvair de vida - continuar na minha memória até hoje.

É, foi a última vez que tivemos notícias um do outro.

Muita coisa mudou. Não sei se adianta dizê-lo, pois no seu céu, na sua realidade, no lugar divino em que habitas, estarei exatamente e para sempre com treze anos. Afinal, foi nesse cômpito de destino que nos separamos. Por isso, tenho a ligeira certeza, que ao escrever esse texto com sentimentos de um alguém com idade mais velha, não estaria condizente com os nossos laços "infanto-paternais". Seríamos como dois adultos conversando depois de muito tempo longe um do outro; seria estranho e, até mesmo, desnecessário. Adultos não conversam o essencial. Adultos conversam resultados. E nunca estão satisfeitos nem prontos.

Não obstante, diferente deles, estaremos nunca terminados de uma outra maneira. Uma maneira que meus sonhos e sua memória celestial se encontrem e bilhem no horizonte lunar da década de noventa, perto de uma casa perto de uma igreja, com uma visão triunfal de infância e cumplicidade.

Faltava luz e me encorajavas. Como um pai deveria e fez, fazê-lo.

E hoje, tempos depois, percebo que careço de coragem. E que não estamos prontos para dizer quando sentimos saudades; que não estamos preparados para as novas pessoas que fazem e farão parte de nossa vida; e que isso tudo me preocupa um pouco, mas também me alivia. Sabe por que, Pai?

Porque foram nas situações de despreparação que puder ver de perto o acabar e surgir de um amor. Foi numa despreparação que vi o fraco se torna forte. Foi em despreparações que vi mudanças. Boas ou ruins. Mudanças. Estreladas ou nubladas. Mudanças. Mas que no "no entanto do mudar", dependiam sempre de quem sofria a despreparação. E em se tratando de sua partida, eu estava, puta merda, bastante despreparado. Porém, nós dois sabemos que a morte e a vida são um despreparo; e o que importa é acreditar no coração de quem acredita na gente.

Acreditar no coração de quem acredita na gente é uma das leis de ouro.

Aprendi isso com os que passaram, estão, continuaram e continuarão comigo no porvir.

É, eu sei. Acho que o senhor sempre percebeu que eu acreditei demais. E também sinto que sabias do quanto é ótimo acreditar nos sonhos, nas metas, nos desejos, nos sentimentos do nosso mais singular Ser. Todavia, puxando-me a orelha, era p'ro senhor ter dito que: acreditar exacerbadamente de forma cega [em tudo] gera ilusões errôneas e distorcidas seja lá do que for.

Ou será que o senhor queria que eu aprendesse isso sozinho?

Não sei. Estou apenas com 13 anos. E queria dizer que sinto muito por faltar mais demonstrações do quanto seu modo de viver faz falta pra nós, os que ficamos em casa.

Lá naquela casa. Na sua casa. Nossa casa.

Entretanto, era pra você ter me avisado que ao dizer que gostamos de alguém, não deveríamos dizê-lo abruptamente. Que ao partir na conquista de nossas conquistas deveríamos ter leveza e seriedade no agir, no pensar, no cativar. Que uma amizade verdadeira vai além de simples gostos comuns. Que é preciso bem mais: sorrisos, choros, calçadas, sinceridades, noites e dias ensolarados.

Certa vezes, não raras vezes, nesses onze desde sua partida, já criei auroras com pessoas importantes por demais na [e para] minha vida. E meio que queria te contar isso já faz um tempinho, sabe... Dizer que aprendi aceitar uma espera vindoura de outra espera como uma grande promessa de felicidade. Dizer que acho que todo dia super feliz deveria vir ensolarado com gosto de praia. E te afirmar que toda noite inesquecível deveria neblinar ao som de uma melancolia gorilesca.

Não igual a melancolia que estou sentindo nesse momento, a Melancolia de Número Onze. Por quê? Ora, pai. São onze anos e aquela misturada de felicidades e tristezas na medida que a vida escolhe e coloca pra gente beber. Onze tempos de viver a perplexidade nos hiatos errados que, no fim final, acabaram por se tornarem os certos. Onze galáxias pra conhecer novos mundos e misteriosos universos; onze desejos no meu saco de ilusões cheio pela borda; e mais onze para saber secá-lo de maneira correta até o fundo, ao lado de quem amo e acredito.

Isso mesmo, pai, você não somou errado. O senhor sabe; eu sei. Nós sabemos. Segredo.

Onze anos de partida e de chegada. Onze anos de onze horas de onze minutos e onze segundos: suspiro. E o que resta são onze saudades com saudações de onze amigos de domingos de onzes.

E é isso. Continuarei com treze anos. Para sempre. Continuarei lembrando de tudo que passamos no meu lembrar. Não esqueça que lembrarei do seu primeiro sorriso ao me colocar criança de berço em teus braços e esquecerei de todo sofrimento e lágrimas tristes deixadas no cair de uma tarde de sábado às quatro horas de uma memória qualquer.


Prentice Geovanni

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