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segunda-feira, 19 de maio de 2014

Colocar queijo na pizza de abacaxi!

Talvez seja esse o grande mistério do gosto que tem a vida. Combinar misturas de sabores escutados pela primeira vez. Eis a solução completa para o enigma da existência! Nada mais, nada menos; nenhum acréscimo. A não ser que, quando, por exceção, estivermos a mercê de algum momento único; e assim, por justa causa, poderíamos ter o luxo da possibilidade de usar a escolha de pedir, quem sabe, uma Coca-Cola bem gelada; tanto para adicionar tempero na memória construída por sabe lá quem estiver comendo dessa pizza, como também, para acentuar o sabor de completude e participação do momento vivido.

Queijo, massa e abacaxi. Ingredientes simples; mundanos, que nem a vida. O que por si só indica algum tipo de desafio amoroso para os românticos; afinal, e com toda certeza, eles somente pensariam em comer tal gostosura - ensinada por deuses celestiais do olimpo gastronômico - acompanhados por seus respectivos amores surreais incorrespondidos. É o destino. Está escrito em algum livro nunca lido por aí.

Foi mais ou menos assim quando me deparei com ela pela primeira vez. O vapor possuía atmosfera de Dylan e as árvores cantavam I Want You entre si, baixinho. Eu não sabia o sabor das palavras, nem que degustar estrelas me lembraria o gosto de cerveja gelada em uma piscina quente; não imaginava que o cheiro da noite escondia uma memória em terra de São João.

Mas, antes de tudo isso, sempre lembrei que seu toque era igual a guitarra celestial do quarto de número 1 no centro do universo: vibrante!

Prentice Geovanni

A LETRA Z

Queria deixar registrado a caminhada sob as estrelas de pedras,
Mostrar a simplicidade trazida por uma brisa que conseguiu escapar do mar.
Gostaria de agradecer ao ato de subida e a quem teve fé de escalar montanhas,
pois assim, consegui ver de perto o azul contemplar o oceano sobre si mesmo.

Nas cantorias noturnas, com gosto de limão doce, as vozes faziam lampejo na areia fina com milhares de universo.
Os mares uniam-se e as ilhas dos atiradores foram encontradas - novamente - em nossos corações, memórias, em união.
E os amores, com sabor de bebida de hortelã fizeram as pazes.
Portanto, vamos em frente, subir, e não nada de cair nas marés fortes de barcos perdidos além horizonte.

Foi assim que vi o nascer de um sol com chamas de almas felizes; Deus presente, equilíbrio.
Naquele dia, meus olhos caíram em dois arco-íris, lado a lado, igual a amizade presente em dias de tristeza.
Chovia muito e os anjos usavam sombrinhas de verão para não pegarem resfriado.
A rua molhada molhava nossos pés; nossas palavras neblinavam e, como água de céu, nos fez sonhar saudades que nem sequer vieram ainda.

Ladeiras, pilares e a falta de algum amor.
O traço e o rabisco de desenho de manhã de domingo continuavam ruim.
Porém, a chuva e o sol se juntaram e contariam seus segredos um por outro:
aquele é o momento perfeito, olhem para eles - felicidade cósmica, coração batendo, pó de supernovas.

As árvores se deixavam chuva, o pão era quente e o chocolate gelado.
Caçadores de infinitudes passavam pela mesa, mas, de jeito maneira, não deixaríamos eles levarem as nossas.
Se necessário, e nos encontrarem, a vida seria a única proteção e escudo.

Pois a vida não é assim, nós que somos a vida.
Vida batida em terra-mar de lembranças e sono.
Vida que, no intervir dos hiatos, a letra "Z" nos protegerá de todos os males.
No temporal mais forte, com um amor perdido e a realidade devastada.

Prentice Geovanni

Ad Astra Per Aspera!

"Não sentimos dor pela partida de quem amamos; sentimos dor pelo período sofrido e deixada ausência." (de uma conversa noturna com Sunshine)

*****

Sabe, cara, você nos deixou exatamente num domingo como esse. O sol estava claro como se queimasse mais que os outros dias da semana; no relógio faziam-se onze horas de uma manhã que teimava em não terminar; e esperar saudações suas nunca foi tão difícil como naquele momento. Mas sabe o mais foda? É aquela sensação de incapacidade - de não ter conseguido fazer nada, além de ouvir o telefone tocar, com os maldizeres de um esvair de vida - continuar na minha memória até hoje.

É, foi a última vez que tivemos notícias um do outro.

Muita coisa mudou. Não sei se adianta dizê-lo, pois no seu céu, na sua realidade, no lugar divino em que habitas, estarei exatamente e para sempre com treze anos. Afinal, foi nesse cômpito de destino que nos separamos. Por isso, tenho a ligeira certeza, que ao escrever esse texto com sentimentos de um alguém com idade mais velha, não estaria condizente com os nossos laços "infanto-paternais". Seríamos como dois adultos conversando depois de muito tempo longe um do outro; seria estranho e, até mesmo, desnecessário. Adultos não conversam o essencial. Adultos conversam resultados. E nunca estão satisfeitos nem prontos.

Não obstante, diferente deles, estaremos nunca terminados de uma outra maneira. Uma maneira que meus sonhos e sua memória celestial se encontrem e bilhem no horizonte lunar da década de noventa, perto de uma casa perto de uma igreja, com uma visão triunfal de infância e cumplicidade.

Faltava luz e me encorajavas. Como um pai deveria e fez, fazê-lo.

E hoje, tempos depois, percebo que careço de coragem. E que não estamos prontos para dizer quando sentimos saudades; que não estamos preparados para as novas pessoas que fazem e farão parte de nossa vida; e que isso tudo me preocupa um pouco, mas também me alivia. Sabe por que, Pai?

Porque foram nas situações de despreparação que puder ver de perto o acabar e surgir de um amor. Foi numa despreparação que vi o fraco se torna forte. Foi em despreparações que vi mudanças. Boas ou ruins. Mudanças. Estreladas ou nubladas. Mudanças. Mas que no "no entanto do mudar", dependiam sempre de quem sofria a despreparação. E em se tratando de sua partida, eu estava, puta merda, bastante despreparado. Porém, nós dois sabemos que a morte e a vida são um despreparo; e o que importa é acreditar no coração de quem acredita na gente.

Acreditar no coração de quem acredita na gente é uma das leis de ouro.

Aprendi isso com os que passaram, estão, continuaram e continuarão comigo no porvir.

É, eu sei. Acho que o senhor sempre percebeu que eu acreditei demais. E também sinto que sabias do quanto é ótimo acreditar nos sonhos, nas metas, nos desejos, nos sentimentos do nosso mais singular Ser. Todavia, puxando-me a orelha, era p'ro senhor ter dito que: acreditar exacerbadamente de forma cega [em tudo] gera ilusões errôneas e distorcidas seja lá do que for.

Ou será que o senhor queria que eu aprendesse isso sozinho?

Não sei. Estou apenas com 13 anos. E queria dizer que sinto muito por faltar mais demonstrações do quanto seu modo de viver faz falta pra nós, os que ficamos em casa.

Lá naquela casa. Na sua casa. Nossa casa.

Entretanto, era pra você ter me avisado que ao dizer que gostamos de alguém, não deveríamos dizê-lo abruptamente. Que ao partir na conquista de nossas conquistas deveríamos ter leveza e seriedade no agir, no pensar, no cativar. Que uma amizade verdadeira vai além de simples gostos comuns. Que é preciso bem mais: sorrisos, choros, calçadas, sinceridades, noites e dias ensolarados.

Certa vezes, não raras vezes, nesses onze desde sua partida, já criei auroras com pessoas importantes por demais na [e para] minha vida. E meio que queria te contar isso já faz um tempinho, sabe... Dizer que aprendi aceitar uma espera vindoura de outra espera como uma grande promessa de felicidade. Dizer que acho que todo dia super feliz deveria vir ensolarado com gosto de praia. E te afirmar que toda noite inesquecível deveria neblinar ao som de uma melancolia gorilesca.

Não igual a melancolia que estou sentindo nesse momento, a Melancolia de Número Onze. Por quê? Ora, pai. São onze anos e aquela misturada de felicidades e tristezas na medida que a vida escolhe e coloca pra gente beber. Onze tempos de viver a perplexidade nos hiatos errados que, no fim final, acabaram por se tornarem os certos. Onze galáxias pra conhecer novos mundos e misteriosos universos; onze desejos no meu saco de ilusões cheio pela borda; e mais onze para saber secá-lo de maneira correta até o fundo, ao lado de quem amo e acredito.

Isso mesmo, pai, você não somou errado. O senhor sabe; eu sei. Nós sabemos. Segredo.

Onze anos de partida e de chegada. Onze anos de onze horas de onze minutos e onze segundos: suspiro. E o que resta são onze saudades com saudações de onze amigos de domingos de onzes.

E é isso. Continuarei com treze anos. Para sempre. Continuarei lembrando de tudo que passamos no meu lembrar. Não esqueça que lembrarei do seu primeiro sorriso ao me colocar criança de berço em teus braços e esquecerei de todo sofrimento e lágrimas tristes deixadas no cair de uma tarde de sábado às quatro horas de uma memória qualquer.


Prentice Geovanni

The Wallflowers

a incerteza de buscar quais palavras certas deveria dizer acabou por deixá-la perdida.
sua cumplicidade com gosto de chuva permeou todos os olhos do mundo, e mais: fizeram-nos chorar.

quanto custa um abraço?
quanto nos pagam por um poema para ela?

seu sorriso já me basta?
seus caminhos me pertencerão?

nunca.

mas a noite estrelada, com vento lateral e coração na mão, sempre estará presente nos meus sonhos.
assim, como o sentido de adeus, na canção da ilha, com ela me esperando dizendo "sim, certamente que sim".

me falaram, e desejaram: vá ser feliz.

feliz, feliz, feliz.

Prentice Geovanni

TEQUILA's

Na busca pelo encontro perdido, ela se fez ponto distante.
seu coração estava bravo e suas estrelas partiam ventos de luz.

como tudo era confusão, o caos revoava por entre os dois.
levando poeira de sonhos, biscoitos de memórias e rancores indevidos.

o seu maior desejo era estar ao lado dela: para fazê-la sorrir, sonhar e contar como seu sorriso sempre fez falta.
(mesmo sem nunca tê-lo visto)

Nossa! o mundo é mais colorido ao conhecê-la.
mesmo de longe.

tão longe.
tanto na vida, quanto nos momentos.
tanto nos sentimentos, quanto nas horas que se falam.

desculpas não caberão agora.
mas poesia sim.
pois ela é sensível e sabe que é muito, muito, Tequila.

e tequilas devem ser bem cuidadas. Pois doses erradas, podem apagar toda história que vale a pena ser contada.
ser criada.
e, principalmente cultivada.

por fim, o mais importante, é que o seu brilho continua chegando até mim.
E eu não vou perdê-lo de vista, nem de sorrisos.

Prentice  Geovanni

diálogo envelhecido.




- mas é só ilusão sua.
- cê acha?
- na realidade, muita coisa mudou
- em você, com você.
- é mesmo.

Prentice Geovanni

Engano.

Bem, antes de qualquer coisa, eu parei com a prosa. É, dei um tempo. Fui encontrar meus penhascos de melancolia e embarcar nos campos da poesia.

É, eu sei, é estranho te escrever isso, mas o que te dizer? Quando se trata de escrever, mentir não combina comigo.

Muito menos quando, na verdade, o verdadeiro gosto de café nos é amargo; e a doçura apenas uma ilusão numa tarde de domingo de janeiro, não é?

Por isso, me desculpe pelas ferrugens e... enfim, partamos para o seu texto. Com alguns asteriscos.

***

No início, pensei que cada pessoa plantada na minha vida fosse como uma memória da minha infância que - por culpa do tempo - eu havia esquecido.

Cada surgir de amigos, me fariam lembrança completa e os anos em vez de envelhecerei, se tornariam crianças.
Foi assim, começo de caminhada, encontrando pedaços de um tempo perdido, que acabei chegando até você.
Ou você chegando até mim, não sei.

Mas sei de algo importante: que a Medicina te fará muito bem. Te digo isso, pois teus olhos mudaram bastante desde a primeira vez que te vi.
Antes seu olhar era fechado como se fosse sempre chuva, agora eles são águia voando alto, aproveitando o vento que surge em tua vida.

E isso mostra o quanto estás feliz. Logo, por sonho e acompanhação, também estou feliz.

Feliz pelos novos caminhos, feliz por me usares numa canção do Dylan, feliz por ter guardado comigo uma estrela que enxerga meu céu pintado - de longe - na noite sem fim...

***

Então, meu bem. Em parte concordo com seu texto. Só em parte. Pois levo comigo o pensamento que todo tempo que nos é dado, é o tempo certo.
Não importando se foram segundos, minutos ou eras. Oras, foi o tempo certo e pronto.
E você soube utilizá-lo muito bem quando esteve comigo;
mesmo com Poe estando certo e errado - afinal, nessa vida, somos sonhos se tornando realidade em todos os momentos que contemplamos nossa existência.

Por conseguinte, com distâncias e tudos, permanences comigo, ao lado da estrela que me presenteaste.
Junto com o alto mar e as lições sobre "como alcançar seus sonhos em sessenta vidas".

***

Ei, lembre-se, você deixou uma semente. Você plantou um lapso de tempo em nossas vidas e, dependendo de como sejam nossas escolhas, acabaremos em algum lugar espaço-tempo.

Não me esquecerei disso, assim como você também não. Pois, a canção já está sendo tocada antes mesmo de entendermos a melodia.

E o que nos falta é lembrar da promessa prometida - que todos prometem - na árvore da vida. Promessa essa de prometer sempre: nos encontrarmos sob o mesmo céu, de frente ao mar.

***

E obrigado pelas palavras.
Suas, e somente suas, palavras.
Elas ecoam no meu coração.


Prentice Geovanni

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Da vez que ganhei um cd.

Quem gosta de Biquini Cavadão?

Eu, particulamente, gosto demais.

Foi escutando Biquini que passei vários dos melhores momentos de minha vida até hoje.

Foi com Biquini interpretando "Chove Chuva" que passei a achar uma neblina mais romântica e com um ar de "nossa como é bom viver".

Foi com Biquini que eu aprendi "Quanto tempo demora um mês" e
como é "Impossível" esquecer amores, amigos e singulares momentos.

Ora, se fosse pra descrever o sonho de ter ido e conseguido convencer todos os Hissatsus a irem comigo ao show de Biquini,
eu descreveria como:

"A ocasião certa com as pessoas certas para a certa perfeição de ter sido tudo perfeito".

Caramba, pense numa noite feliz e marcante.

Acho que foi naquela noite que nos tornamos Astronautas e fomos à Lua. Foi naquela noite que nós tomamos um pouco da loucura do Biquini quando se encontra no palco, para fazer o melhor show de nossas vidas.

Foi depois daquela noite, na volta, que tivemos uma bela vista do amanhecer na Via Costeira ao som do "Boys Don't Cry" do The Cure.

Caramba, com certeza, foi uma baita de uma noite feliz e marcante. Pois, foi ali que refletimos um pouco da magia da vida.
Da mágica da vida e suas ocasiões para que ocorra tudo bem e de uma maneira sincronizada.

Acho que foi ali que cada um teve sua vitória na noite. Foi ali que cada se tornou seu próprio campeão.

Cada um ganhou o seu troféu... Eu ganhei o meu troféu:
duas garotas lombradas me perguntando alguma coisa para se chegar não sei bem em qual lugar. [Não me perguntem nada, pois eu também não entendi o que se passou]

Porém, depois de quase um ano, acabo de receber outro troféu. Um troféu dado por uma grande amiga.

Um troféu que simboliza todos os momentos vividos. Um troféu muito bacana.

Um troféu original. Com as seguintes palavras imaginárias "Pá pêpê".

Um troféu simbolizado na forma de um CD original. [coisa rara hoje em dia]

Pôxa, não é com frequência que me presenteiam. Pôxa raramente sou presenteado.

Mais pôxa ainda: Ninguém nunca me deu um CD original. Aliás, ningúem nunca me deu um CD sequer.

Por isso, como você sabe, tenho o meu trauma de usurpá-los para um bem maior: para minha pessoa.

rs...

Obrigado, meu bem, por curar traumas, cicatrizar feridas e simbolizar memórias.
Valeu a pena esperar e te ver contar como foi complicado escolher esse troféu para mim.

Obrigado,

E só mais uma coisa, lembre-se: Ohhhh Marilene, à noite... tainha, vinho e muito sexo.

Obrigado mesmo, Katy.

Go, Daniel!

Da série: Vamos Detonar Novamente no Espaço-Tempo!

Grande Daniel!

Um dos meus exemplos. O cara que eu sempre admirei e quis ser. O concorrente, o companheiro, o professor, o amigo. Mas quem é Daniel? O bom amigo, o bruto com as palavras? O médico? Vai saber. Daniel está se formando, assim como todos os outros, que estão interligados com ele.

***

Do primeiro contato com esse danado, lembro de termos nos aproximado por meio de algumas mensagens. Não sei muito bem, se foi eu que pedi conselhos, dicas, ou, se foi ele que já me veio com elas. Não lembro. Contudo, e com toda certeza, as dicas eram boas.

Uma das melhores, uma que nunca me esqueci, foi enquantos caminhávamos na rua do Banco do Nordeste: "estude biologia com força! Aquela parte de botânica, coloque pra descer!".

Tiveram outras.

Essas vieram por mensagens antes da prova: "Prentice, força, cara. Os professores acham que vai cair isso e aquilo, portanto, se lembre disso, disso e disso...".E eu me indagava: "Ele sabe que sou concorrente dele?" Porém, sempre agradeci e sempre desejei uma boa prova para ele.

O mais legal é que eu sempre acertava o que ele me dizia. Mas não entendia muito bem qual o motivo dele se preocupar com um cara que conversou tão pouco com ele... e, quando conversou, foi por algum interesse. Nunca fiz perguntas de como a vida é dura em natal e o quanto de solidão ele deve ter passado. Só fiz perguntas idiotas, sobre assuntos idiotas.

Mas, aos poucos, mudei isso. Mudamos. Como? Não tenho a menor ideia...

Todavia, acho que nos aproximamos mesmo, foi quando ele passou no seu vestibular. Nunca me esqueci daquela tarde que ele passou com o velho moto táxi, com a cabeça raspada, com um sorriso no rosto, acenando pra mim com um boné em mãos e gritando: "Depois Passo Aí!".

E ele passou. Assim como outros (Marcela, Romero, Gonzaga) passaram. Todos falando que é possível, que é só ter fé, persistência e foco.

E é sim. Eles estão certos. Todos entendem o quanto é precioso ter uma vida em mãos. Uma criança, um adulto, um idoso. Cada um sabe a valia de um diagnóstico certo, de um parto bem feito, de uma vitória para continuar no jogo da vida. Mas também, eles sabem o que é o desespero por não entender determinada coisa, de enfrentar a morte de perto, de saber as carências que existem vida adentro. Dentro da gente.

E sabes [bem] disso, Daniel. E também não vais esquecer disso, Daniel.

Assim como eu não esqueci daquela vez que você passou aqui em casa pra gente autenticar toda documentação para sua matrícula. Lá, no cartório, um senhor na calçada, nos parou e disse: "olha aí, passaram no vestibular?", acho que cada um respondeu sua resposta. Você que sim, eu que não. E, logo após, esse mesmo senhor olha pra mim e diz: "máh, rapáh, eu via você toda tarde, com seu caderninho, indo pro CEDAP e nem passou?!" E colocou um sorrisão no rosto, depois de dizer isso. Em resposta você ficou calado, e eu dei o velho sorriso amarelo de "Que filho da puta!".

Dentro do cartório não falamos sobre o senhor. Autenticamos o que tinha para autenticar e pronto. Ao sairmos, lembro de não termos um mínimo de cabimento com esse senhor e, ao enrolarmos a esquina, você meio que quase gritando fala:

"Ahh! Cabra Cavalo! Aquilo é um Cavalo!"

E eu rindo muito, confirmei:

"Cavalo? Cavalo, sim!"

Esse dia foi massa. Assim como o do seu churrasco, do seu alistamento... (Esse foi um dos melhores, mas não contarei aqui) Claro que tiveram outros momentos únicos e singulares... (lembra que íamos fazer trabalho lá na casa de uma pessoa só pra comer bolacha amanteigada? Ê tempo bom!)

Porém, o fato é que você sempre foi aquele garoto que foi pra Natal e toda turma ficou aqui. E [porém do porém] quando você voltou, passado em medicina, você comemorou com a gente. Comemorou com a turma que você considerava. Como se a vitória também fosse nossa. E, olhe, que naquela época não tinha Facebook pra conectar todo mundo. Era coisa de sentimento mesmo e respeito.

E, saiba, meu caro, fora você ser dedicado na medicina [e em tudo que almejas - ensinar, por exemplo], algo que sempre admirei em você e nunca te disse, é isso: saber quem realmente importa na nossa vida e saber a quem se doar e colocar na nossa vida. Para que assim não ocorra uma perda de tempo... Para que assim ocorra uma diferença entre o que realmente vale a pena lutar e o que não vale a pena lutar tanto assim.

Obrigado, por ensinar isso, cara.

Mas, voltemos ao que interessa. Afinal, não estou aqui para embelezar o que vivemos. Artur, Galileu, Marcus [vigia], Magnun [e sua biz amarela], Igor, Franklin, Carlinhos, Mikhail, Gonzaga, Helem e outros, sabem que isso não é preciso (inclusive você).

E acho que a maior finalidade desse texto [para a Vossa Senhoria] é servir como rito de passagem, pois, Cara, você se formou e tem uma nova etapa de sua vida para fazer bem. Bem feita. Você sabe o quanto sofreu, você sabe o quanto foi difícil. Só você sabe como sonhar é ao mesmo tempo tão desgastante e recompensador. Só você sabe a satisfação de chegar ao fim e a um início. Só você sabe o que lhe foi tirado e o que lhe foi reposto. Só você sabe como contribuir e melhorar vidas.

Só você sabe: tudo o que aprendeu e o que tem para aprender!

E [sim] você soube, mesmo nas maiores alturas, ser sempre quem és: o Daniel que procura saber da gente com a seguinte pergunta "E aí, mestre? Tudo em ordem?"; o Daniel que se preocupa conosco; o Daniel que sempre esteve nos natais na velha pracinha...

Você é o Cara, Daniel. Lembre-se disso. Jamais esqueça.

***

Mas e aí? sabemos quem agora é Daniel? Provavelmente não.

Pois Daniel [ainda] está se formando... Não apenas em medicina, mas como ser humano, como uma pessoa que cativa quem tem de cativar, como uma pessoa que vai cuidar [e cuidar bem] de quem precisa, como um desbravador em busca de uma terra desconhecida, de uma cura, de um refúgio.

No mais, falarei o que você sempre me disse e o que os nossos amigos dizem pra gente: "Vá confiante em direção a seus sonhos. Viva a vida que imaginou". - Henry David Thoreau

Daniel Rogerio

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Da vez que...

Pode parecer estranho, mas mesmo não sendo, porque estranho é tudo aquilo que não se conhece, e, em se tratando disso, caso conhecido, portanto, não estranho, visto de vista, presenciado de presença, olhado de longe: sabido; foi assim, que surgiu, de passagem passada, no tempo, minha vó.

***

"Quem num pode com o pote não segura na rudía. Antes, nessa rua daqui da frente, no lugar dessas galerias, tinham Caibeiras. Seu avô dizia que cansou de levar Bidú, Compade Zé, Galego e tantos outros para casa. Tudo medroso. Ficavam conversando até tarde e, na hora de se ir, ninguém queria ir, ir só. Por acaso, ele era moleque de entrega? Nada. Era corajoso. Não tinha medo de assombração. Aqui, no esquisito, cheio do mato, via-se passar muitos malassombros. Homem do caixão na cabeça; mulher chorando, se lamentando, na calada de noite; cachorro preto 'doszolhos' vermelhos - grandão; a mulher vestido de preto que acompanhava quem passasse sozinho, lá, 'praquelas' bandas do cemitério velho; e a porca dos dentes de ouro e seus filhotinhos. Zuada danada. Se lembra da 'purteira' do balanço, né? Muita gente já levou carreira por ali. Por isso, lhe digo, quem levanta 'difunto' encontra assombração. Se existe ou não existe... não sei. É preferível rezar e se confiar em Deus. Esse negócio de igreja, de ir todo dia para missa, não. Domingo já tá bom. E se não tiver de chuva. Num vou adoecer. É o padre que vai vir me dar remédios. nam! Puxei ao meu pai.

Antônio. Minha mãe chamava: Antôn-ní-nhó. Era engraçado. Pai era uma graças. Brabo. Teve uma vez. A da calçada. Uma vez ele inventou de fazer a calçada lá de casa. Pai fazia de tudo. Tinha oficina, montava casa, desmontava o que tinha de desmontar e fazia raiva. Não muita. Mas o bastante.

- Seu Antônio. Num pode fazer calçada assim. Lisa, lisinha, desse jeito. A prefeitura num deixa.

- A calçada é minha e eu faço do jeito que eu quiser. É 'prá' danar queda em gente! Quero ver nêgo se danando no chão!

- Seu Antônio, e as crianças, seu Antônio?!

- Que faça de conta que essa calçada é do cão!

Nessa hora, mãe apareceu e disse:

- Do cão não! Deus me livre!

E ele desdizia:

- Do cão sim. Do cão! É pra danar queda em gente! Quero ver as pernas de quem cair assim, blummm, no ar.

Assim dito. Assim se fez. Calçada feita. Lisa que nem manteiga. Escorregava que era uma beleza. Daí, deu uma chuva e o primeiro a cair na calçada quem foi? Ele. Na mesma hora, instante, se levantou, foi lá dentro, pegou as ferramentas e, enquanto quebrava a calçada todinha, dizia alto e na chuva:

- 'CACHORRAh DA 'MULESTAh'! VOCÊ NUM VAI 'DÁh' MAIS QUEDA EM NINGUÉM, 'INFILIZ' DOS QUATROCENTOS SEISCENTOS MILIGRAMA!

Pai era engraçado demais. Não engolia desaforo. Eu também não. Agora você já sabe da minha língua solta. Quando tem algo errado, eu digo mesmo. Quem vier 'pro' meu lado com suas 'enrolada', leva um batido. Já estou velha digo o que quero e vou pra onde eu quiser.

Quando chega seis horas, não conte comigo 'pra' nada. Nos intervalos da novela coloco sua jantar. Você já sabe. Saiba a hora. 'Pra' tudo na vida isso é necessário. Paciência. Coisa que meu pai num tinha. Vinha um homem andando na rua, em cima de um jumento, beeeeem 'devagarzinnn'. Pai olhava e dizia:

- Tá vendo que eu num ando num jumento desse! Eu 'pêgáva' era o jumento e 'butava' ele nas costas e ia simbora, 'djábo'! 'Djábos' te leve com tua moleza!

É, prentis, seu bisavô era engraçado. O povo gostava dele?

Gostava sim. Só era um bebo chato. Ele parou de beber no dia em que de tão bebo, subiu numa casa, subiu, subiu, e num soube mais descer.

- Cachorra da mulesta! Que eu num bebo mais! Nem saber descer de uma casa eu 'tou' sabendo. Cana 'mizerávi'. Num bebo. Num bebo. Num bebo mais!

Mas antes disso. Antes de parar de beber. Teve um episódio. Assim como tantos outros que lhe conto.

Lá 'pra' banda de Araruna tinha uma cafezal. E nesse cafezal diziam que tinha um fantasmas, um assombro assombrando o povo. Dava Meia-Noite e lá vinha aquele negócio branco: uuuuuu- uuuuuu- uuuuuUUU! E tome carreira em quem passasse por ali, de noite. Pai, homem brabo, que num gosta de mistério.

- Amanhã, vou ver esse malassambro.

- Seu Antônio. Num vá mexer com isso. Com coisas do outro mundo ninguém..., a gente deixa quieto.

- Resolver isso amanhã.

E foi. Tomou uma antes de ir e não escutou o que Quatocão falou de não mexer com as coisas do além.

Meia-Noite. Lá vinha vindo aquele vulto branco. Na direção de pai.

- uhaaaaahhuuuuu...

Aí pai 'pra' trás gritava também:

- eeeeehhhhhuuuuaaah!

E a alma penada:

- muahahahaaaaaaaaa...

E Pai, mais alto:

- ihuaahahauuuuaaaa...

Num sei quem era mais marmotento: ele ou a alma. Só sei, meu fi, que essa alma percebeu que pai num ia correr. E, vendo isso, começou a pegar de volta 'pros' cafezais. Correu caminho de volta. Ligeiro. Corrido. Como 'djábo' foge da cruz. Pai, vendo a arrumação, meteu carrerão atrás da penada.

- CACHORRA DA MULESTA, EU LHE PEGO! CORRA! AMALDIÇOADA! VOCÊ TARÁ COM O SETE PELE, CAPETA!

Era pega 'pra' capá. Ela na frente, por cima de pau e pedra, e, ele, atrás, chamando tudo o que é nome, menos o de Deus.
Pois foi. Quando 'défé' a alma se atrapalhou e 'trubicou', estatelou-se no chão, dando tempo 'pra' Pai alcançar.

- Tá presa! CACHORRA DA MULESTA! Ahhhhhh... é você?

- Seu Antônio, pelo o amor de Deussss! Num conte isso a ninguém!

- Como é que você num tem vergonha?! Assombrando o povo a essa hora da noite! Eu vou é encher a rua amanhã! Vou contar a 'tudin'.

Ele não contou. Só se soube que nos dias que se passaram o malassombro tinha sumido. Findou. Acabou.
Seu Bisavô tem muitas dessas histórias. Depois lhe conto mais. Vou ver minha novela agora."

Mas vó, peraí, quem era o malassambro?

"Ah, o malassombro era uma mulher que botava chifre no marido. Ela fazia as presepadas dela e depois ia fazer essas 'milacrias' no meio da noite.

Tinha gente 'pra' tudo naquele tempo. Imagine agora que tá tudo 'sarrabuiado' assim. Deixar a louça aí, depois lavo. Ligue lá na globo 'pra'mim, enquanto coloco o café 'pra' gente."

Tá bom, vó. Conta aí de novo a vez do abacaxi, a da botija, a da briga na feira, a da topada na pedra?

"Depois. Vou ver minha novela. E vá ligar a televisão. Cuida! Já começou!"

Tá em Datena ainda.

"Quando acabar Datena começa. Deixa aí. Queimaram o dentista. Hoje tem que ter dinheiro, porque se não tiver os bandidos queima. Queima ou dão umas 'tapa' boa."

É, vó. O cancão tá piando.

"Nem piando tá mais. Mataram já".

É mesmo.

"Tu já vai segunda, né? Num instante se passa. A casa fica um silêncio. Gosto quando tão todos em casa."

É... Num instante, Ave Maria!

"E deixe esse curso. Coisa difícil, nam. No meu tempo de escola, eu colava tudo. Quebrar cabeça com isso. Meu negócio é cozinhar um bom comer."

'Pia' os exemplos. O feijão estava uma delícia mesmo.

"Mas eu já digo. Em razão de estudo não quero que meus netos puxe nenhum a mim. E escolha outra coisa, isso não é 'pra' você. E se for, num é agora."

Mas vó...

"A novela começou. Essa mulher aí é uma bandida! Enrola o pobi."

Qual?

"essa aí, ó".

Mas você só faz dormir nas novelas... como sabe?

"Eu? Eu não. Sei tudo o que se passa."

Vó. Vó. VÔ!

"OI?! Deixa de grito, menino."

Você aí. Dormindo.

"Tava não".

Tava.

"......."

Vó. Vó. VÔ!

"Que é, menino?"

nada.

"Pois me deixe assistir a novela aqui."

Tá.

***

Tá certo vó. Pois a saudade fica e somos nós que vamos. No tempo. Na lembrança. Na memória. No coração. No construir da construção construída da nossa vida de sonhos e realizações.

Parabéns, minha vó. Obrigado por ser minha vó. E por fazer aquele pão francês com manteiga e suco de maracujá que só a senhora soube e sabe fazer. No tempo, no espaço e na minha infância.


Prentice Geovanni